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quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

ESQUADRÃO DA MODA: Uma dose de glamour para a “Classe C”

Esses dias, como eu não tinha aula à noite, resolvi assistir um pouco de TV junto com minha mãe e meu pai. Ali estava eu, esparramado no sofá, com aquele tênue fio de baba prestes a escorrer pelo canto da boca, aguardando o início de algum capítulo de novela global. Mas, de repente, algo insólito aconteceu, ao menos para mim: meu pai deu um grito lá do quarto, “já não tá na hora do Esquadrão não?”
Esquadrão? Seria algum novo filme de ação do Vin Diesel?
Qual não foi minha surpresa, quando vi meu pai e minha mãe sentados no sofá, sem qualquer remorso por ter profanado a audiência global, rapidamente estacionando o olhar afoito no SBT!
Isso mesmo, eu acabava de descobrir o novo sucesso do nosso panamericano ex-camelô, o ESQUADRÃO DA MODA!
Lançado agora em 2010, o programa é apresentado pelos quase-engraçados Isabella Fiorentino (top model) e Arlindo Grund (estilista) e tem por objetivo ensinar os telespectadores a se vestir adequadamente, trocando aquele velho guarda-roupa que podia lembrar o Magal, o Beto Barbosa, Joelma Mendes (Calypsoooo!) ou Hebe, por um vestuário sofisticado e fervorosamente dedicado a cumprir os bíblicos e descartáveis manuais da moda.
Valendo-se da fórmula-mestra Reality Show, o Esquadrão filma (escondido?) por duas semanas a vida de mulheres consideradas “deselegantes”, seja pela amelice ou pela gretchenice. Depois, os apresentadores aparecem de supetão, duendes do jardim televisivo, e fervorosamente propõem para as toscas muchachas o ritual de iniciação no consumo fashion (Como incentivo, oferecem 10.000,00 reais para se escolher as melhores roupas de grife previamente escolhidas pelo programa). Ao final dos rituais, cabeleireiros são evocados para santificarem as heroínas, livrando-as de sua banalidade e pieguice, exibindo-as em um andor-passarela que deverá durar apenas o momento em que as câmeras estiverem ligadas.
Até aqui, nada de novo, afinal, gerar catarse no telespectador a partir do compadecimento e satisfação por ver seres tão cafonas e triviais quanto ele mesmo se transformando em celebridades tem sido uma receita teatral muito utilizada pela mídia há bastante tempo. Sendo assim, voltando aos meus pais, o que os teria levado a migrar para o programa, abdicando das outras catarses premeditadas da novela da Globo e da Record?
Após pensar um pouco, compreendi que o Esquadrão e sua boa audiência (atingindo em média 9 pontos no Ibope, geralmente ficando em segundo lugar, roubando uma fatia significativa da torta-pronta dos Marinho) resultam de um fenômeno social que se ampliou no Brasil nos últimos anos: a melhora econômica da chamada “Classe C”, capaz agora de comer melhor, informar-se melhor e, obviamente, vestir-se melhor. É, Dona Maria, chegou a sua hora da estrela, que nem aquelas da novela! Aliás, enquanto a novela se contenta em distribuir sonhos para a classe C, o Esquadrão se dispõe a propor planos a serem executados com alguma economia. O sucesso do bordão “Só me falta-me o glamour” parece bem adequado a esse processo de ascensão social e, por conseqüência, o mercado e a mídia passam a ter novos nichos a serem desbravados com esses novos públicos que se formam. Assim o Esquadrão da moda apresenta-se como agente disciplinador do bom-gosto e da etiqueta, ensinando o brasileiro a se portar como classe média, condenando os velhos hábitos matutos e maquiando as rígidas formas de controle com a repetição de expressões como “recuperar a auto-estima” e “o importante é você ser você mesmo”.
P.S.: marxismos à parte, achei até bonito ver meus velhos tão alinhadinhos ultimamente ...

(PEREIRA, Volmir Cardoso. ESQUADRÃO DA MODA: Uma dose de glamour para a “Classe C”. Disponível em http://academiadolixo.blogspot.com/. Publicado em 1 de dezembro de 2010.)
Referências
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“VIVER ULTRAPASSA QUALQUER ENTENDIMENTO” (C.L.)

7 comentários:

  1. Nossa!!! texto muito bom, realmente a idéia de discussão acerca do lixo q nos ronda é genial(os mais comprados, os mais vendidos, os mais assistidos...) afinal, o "lixo não pode ser apenas jogado fora, antes ele precisa ser reciclado para podermos dar uma utilização adequada a ele".ahauhahauah aguardo mais postagens...parabéns...

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  2. lixo = coisas que jogamos fora;
    coisas = lixo que guardamos.

    @diegotofoli

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  3. Não conheço o programa citado, mas me cheira a uma tradução malfeita de tantos reality shows americanos e europeus...
    Com uma crueldade cômica, mais um programa a favor do consumismo...

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  4. Volmir: a baixa auto-estima das pessoas chega a tal ponto que programas como o Esquadrão da Moda não são apenas uma repaginação figurativa. São, sobretudo, uma tentativa de "levantar o astral" de pessoas que não têm condições econômicos e/ou críticas de se encaminharem para um terapeuta. Rosana.

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  5. Olá, Volmir. Todos, articulista e comentaristas têm razão. Mas talvez devêssemos apostar que seja esse modo enfeitado do consumismo sobre a falta de autoestima uma nova educação, meio torta, quem sabe mais eficiente. Ficarei aguardando as aulas de boas maneiras, nãoviolência, ética, respeito, meioambiente, etc.
    Alda Maria Quadros do Couto

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  6. Oi, Valmir. Concordo com você. Impressionante ainda é que eles dão R$ 10.000,00 para que uma pessoa com tantas outras necessidades e outros membros na família, gastar em roupas e acessórios absurdamente caros e que depois de um tempo ela não poderá mais adquirir. Na minha humilde opinião, o programa serve apenas para fazer propaganda de lojas caras e marcas exibindo suas opções de venda.

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